Pular para o conteúdo principal

Fátima


São muitas as voltas para chegar a Fátima. Há certamente caminhos mais rectos, mas dos lados donde o viajante vem, com mistura de mouros e judeus, não é de estranhar que tenha achado o percurso longo. Hoje, a imensa esplanada é um deserto. Só lá ao fundo, ao pé da Capela das Aparições, se juntaram algumas pessoas, e há pequenos grupos que se aproximam ou afastam distraidamente (...) O viajante, que é impenitente racionalista, mas que nesta viagem já muitas vezes se emocionou por causa de crenças que não partilha, gostava de poder comover-se também aqui. Retira-se sem culpas. Saramago, Viagem a Portugal, p. 285.



Definitivamente, Saramago não gostou de Fátima - o conjunto arquitetônico, esclareça-se. Viemos, ao contrário do viajante, de Lisboa, com o senhor Bernardino. No caminho, percebemos a diferença entre o Brasil e um país que não se pode dar ao desplante de desperdiçar terra: em quarenta minutos, passamos por vinhas, macieiras, pereiras, figueiras, oliveiras, além de modernos moinhos eólicos. Em nenhum momento passamos por capim alto.

Chegamos a Fátima pela manhã - segundo o senhor Bernardino, o melhor horário para visitá-la. Não necessariamente para quem quer rezar. O complexo está vazio, com um pequeno grupo acompanhando uma missa na Capelinha das Aparições. Como uma das previsões teria sido a queda do comunismo, há um pedaço de betão, resto do Muro de Berlim lá próximo. No Santuário estão os túmulos dos três pastores.


A estátua de João Paulo II, devoto e para quem a pastora Lúcia revelou o último segredo da Virgem, está lá, em frente a um novo e moderno santuário, do outro lado da basílica.

Comentários

  1. Conhecer Fátima era um sonho de infância. Chegar lá e ouvir as músicas que aprendi, quando pequena, na catequese, me fez simplesmente me sentir em casa. Rezei, cantei, me emocionei.... Quero voltar outras vezes, com mais tempo para participar de uma missa inteira ou rezar o terço em vários idiomas, me misturando a multidão de fiéis em um só coro. Saí de lá renovada!!

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

O conto da semana, de Italo Calvino

O conto da semana é novamente de Calvino – Quem se contenta – e integra Um General na Biblioteca : Havia um país em que tudo era proibido. Ora, como a única coisa não-proibida era o jogo de bilharda, os súditos se reuniam em certos campos que ficavam atrás da aldeia e ali, jogando bilharda, passavam os dias. E como as proibições tinham vindo paulatinamente, sempre por motivos justificados, não havia ninguém que pudesse reclamar ou que não soubesse se adaptar. Passaram-se os anos. Um dia, os condestáveis viram que não havia mais razão para que tudo fosse proibido e enviaram mensageiros para avisar os súditos que podiam fazer o que quisessem. Os mensageiros foram àqueles lugares onde os súditos costumavam se reunir. - Saibam – anunciaram – que nada mais é proibido. Eles continuaram a jogar bilharda. - Entenderam? – os mensageiros insistiram – Vocês estão livres para fazerem o que quiserem. - Muito bem – responderam os súditos – Nós jogamos bilharda. Os mensagei

Conto da semana, de Jorge Luis Borges - Episódio do Inimigo

Voltamos a Borges. Este curto Episódio do Inimigo está no 2º volume das Obras Completas editadas pela Globo. É um bom método para se livrar de inimigos: Tantos anos fugindo e esperando e agora o inimigo estava na minha casa. Da janela o vi subir penosamente pelo áspero caminho do cerro. Ajudava-se com um bastão, com o torpe bastão em suas velhas mãos não podia ser uma arma, e sim um báculo. Custou-me perceber o que esperava: a batida fraca na porta. Fitei-o, não sem nostalgia, meus manuscritos, o rascunho interrompido e o tratado de Artemidoro sobre os gregos. Outro dia perdido, pensei. Tive de forcejar com a chave. Temi que o homem desmoronasse, mas deu alguns passos incertos, soltou o bastão, que não voltei a ver, e caiu em minha cama, rendido. Minha ansiedade o imaginara muitas vezes, mas só então notei que se parecia de modo quase fraternal, com o último retrato de Lincoln. Deviam ser quatro da tarde. Inclinei-me sobre ele para que me ouvisse. - Pensamos que os anos pa

Conto da semana - Saki

O conto da semana é   A Porta Aberta , de Saki, ou melhor, Hector Hugh Munro (1870-1916). Saki nasceu na Índia; o pai era major britânico e inspetor da polícia de Burma. O autor morreu no front francês durante a I Guerra. Já havia falado dele num post sobre a coleção Mar de Histórias , de Ronai e Aurélio, bem como um curta nacional. Ele está no volume 9. Mas apenas mencionei este conto, de cerca de cinco páginas. O vídeo acima é uma produção britânica de 2004 com Michael Sheen (o Tony Blair do filme "A Rainha") como Framton Nuttel, e Charlotte Ritchie como Vera, a menina de cerca de quinze anos que "faz sala" enquanto sua tia não chega. E começa a contar ao visitante sobre a terrível "tragédia" que se abateu sobre a tia, a Sra. Sappleton. O conto é um dos mais famosos de Saki, conhecido por tratar do lado cruel das crianças.