Gonçalo Tavares é, sem dúvida, o mais prolífico dos grandes novos autores portugueses. Descobri esse pequeno conto - O País Ingênuo - na antologia BEF 2011. Como é muito esquisito - além de ridículo - ler autor português traduzido em inglês, procurei pela versão original. Achei-a no site da antiga e, infelizmente finada, Revista Entrelivros.
A tristeza era tanta que os sorrisos passaram a ser pagos. Alguns funcionários do Estado, disfarçados, diluídos na multidão das cidades, observavam os poucos cidadãos sorridentes que passavam, e, discretamente, mandavam-nos parar.
Apresentavam-se: Funcionários do Estado!, diziam, e pediam depois a identificação do sorridente. Registavam nome e morada.
Ao fim do mês, os referidos cidadãos recebiam o cheque. Durante o mês de fevereiro foi visto três vezes a sorrir na rua – estava escrito – com data e hora - no pequeno documento que acompanhava o dinheiro.
A quantia dada por cada sorriso não era uma fortuna, mas digamos que ser visto pelo Estado a sorrir nove vezes durante um mês dava perfeitamente para viver sem dificuldades.
Pois bem, em pouco tempo o clima emocional do país alterou-se por completo. Seja por avidez ou pela própria natureza das coisas o país em dois anos tornou-se conhecido pelo “permanente e impressionante optimismo dos seus cidadãos”, como se dizia numa agência de notícias internacional.
Os subsídios do Estado aos sorrisos terminaram pouco tempo depois; mas como ninguém informou os cidadãos eles mantiveram aquele sorriso estúpido, repugnante, desadequado, inútil, sem razão de ser.
Comentários
Postar um comentário