Mas Óbidos merece todos os mais louvores. É bem possível que a vila tenha um modo de viver um pouco artificial. Sendo lugar obrigatório de passagem e permanência de visitantes, toda ela se compôs para tirar, não um retrato, mas muitos, com a preocupação de em todos ficar favorecida. Óbidos é um pouco a menina de tempo antigo que foi ao baile e espera que a venham buscar para dançar. Vemo-la muito composta na sua cadeirinha, não mexe uma pestana e está raladíssima porque não sabe se o caracol da testa se desmanchou com o calor. Mas, enfim, a menina é mesmo formosa, não há que negar. Saramago, Viagem a Portugal, p. 330.
No caminho para Óbidos, passamos por Caldas da Rainha, e o senhor Bernardino conta que a rainha estava por aquelas bandas quando se sentiu muito mal. Toda a comitiva parou, preocupada; um pastor disse aos guardas que havia um lugar, malcheiroso, que fazia muito bem às suas cabras. O guarda prendeu o sujeito, que teria comparado Vossa Alteza com uma cabra. No meio dessa confusão, a rainha interveio, e pediu explicações. As explicações foram dadas, a rainha foi até a tal fonte, e do pastor nunca mais se teve notícias. As águas, sulfurosas, curaram o mal-estar real, e naquele local foi fundada a cidade de Caldas da Rainha. A partir daí, foi construído o aqueduto, que abasteceu Óbidos por muitos séculos.
A mesma rainha adorava Óbidos, e queria fazê-la capital. O rei, que não aguentava mais a insistência da esposa, deu-lhe a cidade de presente. Bons tempos em que os reis faziam o que bem lhes dava na telha, e quem dele discordasse perdia a cabeça, sem maiores questões jurídicas e processuais...
O ponto alto do dia foi chegar a Óbidos, por volta das 16 horas, uma antes do início do Mercado Medieval. Por um lado, deu vida à cidade, agitadíssima. Por outro, tirou, ao menos naquela visita, um ar que encontramos em Ávila, na Espanha, há mais de dez anos - quando ultrapassamos seus portões, parecia realmente que tínhamos voltados uns dez séculos...
Para as crianças, um grande barato. Camelos, mercadores, tudo para recriar, com o maior detalhamento possível, uma feira medieval. Pena que tínhamos de sair relativamente cedo; o evento ia até a noite, com direito a competições medievais e ceias. Passei por uma tenda que assava coelhos inteiros, o que me aumentou o apetite - e embrulhou o estômago da turma.
A cidade está muito bem conservada, e como sempre ressai a preocupação europeia em permitir o crescimento destes lugares extramuros, mantendo-se ao máximo o núcleo original. Cresce-se com preservação.
Óbidos realmente é um lugar especial - um misto de Ouro Preto, pela arquitetura e ruelas e Ávila, pelas muralhas. Adorei!!
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