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Mostrando postagens de outubro, 2016

Enclausurado, de Ian McEwan

Um ano com lançamento de Ian McEwan é sempre um bom ano. Enclausurado tem como narrador um feto.  Se Machado de Assis criou um autor defunto, McEwan tratou de nos apresentar um autor nascituro, ainda inominado. Poderia perfeitamente se chamar Hamlet, já que McEwan parece trazer para a Londres de hoje a história de Shakespeare. Gertrude (Trudy) e Claude planejam o assassinato do marido/irmão, John Cairncross, para se apoderarem do imóvel da família, uma velha casa em ruínas mas localizada num ponto da cidade que a faz valer alguns milhões. O Hamlet intra-uterino de McEwan é consciente. É como se, de dentro de sua mãe, dispusesse de uma boa biblioteca ou, vá lá, acesso ao Google: ele reconhece ser um felizardo, já que, de todas as opções possíveis, será um europeu ocidental. Claro, nem tudo é perfeito: não terá os benefícios sociais nem o poderoso fundo soberano de um norueguês, nem nascerá na ensolarada decadência italiana (e sua culinária) ou na França, com seu amor

Bob Dylan

Estava em Roma na semana passada quando foi anunciado o nome de Bob Dylan para o Nobel de Literatura de 2016, pela Academia Sueca. Não é correto dizer que foi uma grande surpresa pois, afinal, seu nome já apareceu como favorito na lista da Ladbrokes há alguns anos. Desta vez, no entanto, não aparecia entre os 10 mais apostados (ainda que, na madrugada de 12 para 13 de outubro, seu nome tenha despontado para quarto lugar - deve haver algum vazamento nesse negócio). Martin Amis, Michael Cunningham e Salman Rushdie foram os primeiros - que eu saiba - a elogiar a decisão. Dylan é um grande músico e, como tal, um grande poeta, dizem. Em Tangled Up in Blue, por exemplo: Then she opened up a book of poems   And handed it to me   Written by an Italian poet From the thirteenth century Will Self, por outro lado, disse que Dylan terá a grande chance de imitar Sartre e, felizmente, recusar o prêmio... O que dizer? Todos os leitores do mundo parecem ter o poder-dever

Bellow e Roth

Às vésperas do anúncio do Nobel de Literatura de 2016, um excelente texto de Isabel Lucas, no caderno Ipsilon, que pode ser lido aqui. Um trecho:   Philip Roth e Saul Bellow conheceram-se em Chicago em 1956. Roth era estudante na Universidade de Chicago, e Bellow "um dos seus entusiasmos literários", como o definiu em  Os Factos. Foi em Chicago que leu  Augie March  e viu um exemplo do génio de Bellow, para ele “o grande libertador do tradicional confinamento da literatura judaica”, lê-se em Roth Unbound . Entre outras coisas, foi também evidente que “a experiência judaica podia ser parte da literatura americana”. Zachary Leader, autor da biografia  The Life of Saul Bellow , cuja primeira parte foi publicada em 2015 (sem tradução em Portugal), referiu agora ao PÚBLICO que para Bellow era claro que como escritor “estava em melhor posição enquanto judeu na América do que um judeu na Europa”. Porquê esta afirmação? “Apesar dos alertas e das suspeitas em relaçã