Pular para o conteúdo principal

Postagens

Mostrando postagens de outubro, 2011

A Página Assombrada por Fantasmas, de Antônio Xerxenesky

Editora: Rocco Ano: 2011 128 páginas Em geral coloco o livro que estou lendo nos cantos do blog, mas li essa coletânea de nove contos em algumas horas; sequer deu tempo...  São contos – como o do último post, o conto da semana passada – curtos, sempre jogando com a própria literatura. No conto escolhido para o título, a presença de Borges assombra uma Buenos Aires que parece pairar sobre uma outra, moderna e infestada de turistas. Ou o detetive especializado em localizar escritores reclusos e que, numa viagem a São Petersburgo (onde mais?) descobre um complô envolvendo Thomas Pynchon e... Ana Kournikova! São contos em certo sentido bastante pessoais; o autor consegue com indiscutível sucesso colocar seus autores e livros favoritos como os principais personagens. Pode-se torcer para que ocorra a Xerxenesky aquilo que ele mesmo descreve de seu personagem: Charles Mankuviac. Brasileiro, apesar do nome. Um escritor contemporâneo de grande repercussão mundial, apesar de

Sequestrando Cervantes, de Antônio Xerxenesky

Em A Página Assombrada por Fantasmas (Editora Rocco, 2011), Antônio Xerxenesky (n. 1984) apresenta nove contos, quase todos passados no futuro. Neles, o autor se vale das leituras que fez – Vila-Matas, Pynchon, Cervantes - para criar situações na fronteira entre ficção e realidade. Na verdade, essas leituras são os principais personagens de seus contos. Neste sentido, é impossível não lembrar imediatamente de Enrique Vila-Matas... Em Sequestrando Cervantes , o conto da semana, Xerxenesky mostra um mundo em 2085, no Reino Unido, sob domínio de um “partido ceticista”. Um mundo em que é raro encontrar folhas de papel , os livros “analógicos” ou mesmo especialistas em literatura . O novo regime se propõe a alterar os livros – no caso, Dom Quixote; os livros de cavalaria de sua biblioteca seriam substituídos por tratados científicos. Também as coisas seriam invertidas, e Sancho veria os gigantes, sendo repreendido por Quixote (aliás, Alonso Quijano). Um complô contra os livros,

As bibliotecas de Goulemot

Editora: Unesp Ano: 2011 Tradução: Maria Leonor Loureiro 236 páginas Para mim, uma biblioteca pública é essencialmente um lugar consagrado à leitura. Tomei nitidamente partido entre a comunicação e a conservação nesse debate que ainda divide, ao que parece, os curadores e a administração das bibliotecas. Sou partidário da comunicação, apesar de meus gostos de colecionar inveterado e de entesourador de impressos e apesar da consciência de ter a biblioteca outras necessidades que as do leitor em geral. Desde a adolescência, frequento muito as bibliotecas, e fico geralmente feliz e satisfeito. Li aí mais livros do que no meu escritório ou no trem, e um destino de professor universitário de província fez de mim um usuário cativo desse último (p. 7). Nos últimos anos, passei a me interessar pelos “livros sobre livros”, é bem verdade desde que me tornei leitor assíduo de Alberto Manguel. Sua visão da leitura e seus livros sobre a sua própria biblioteca, como um refúgio privado, agora

Jorge Luis Borges

O conto da semana é de Borges. Na verdade, assinado por George Loring Frost, e consta do livro Antologia da Literatura Fantástica, organizada por Borges, Silvina Ocampo e Adolfo Bioy Casares. Mas não há referência alguma a Frost na literatura inglesa (ele teria nascido em Brentford, em 1887, e o conto, aparecido em seu livro Memorabilia , de 1923). Muitos adivinharam a brincadeira de Borges, e o tem como o autor do conto El creyente. Al caer de la tarde, dos desconocidos se encuentran en los oscuros corredores de una galería de cuadros. Con un ligero escalofrío, uno de ellos dijo: - Este lugar es siniestro. Usted cree en fantasmas? - Yo no - respondió el otro - Y usted? - Yo sí - dijo el primero y desapareció. Outros, no entanto, se referem ao conto como de autoria do inglês. O que você acha?

The Sense of an Ending, de Julian Barnes

Random House 2011 144 p. What you end up remembering isn't always the same as what you have witnessed. O livro acaba de levar o Man Booker Prize 2011. Barnes já havia integrado quatro shortlists e agora, finalmente, recebe o mais importante prêmio literário inglês. Li pelo Kindle, e a Editora Rocco ainda não definiu a data da edição brasileira. History is that certainty produced at the point where the imperfections of memory meet the inadequancies of documentation. Tony Webster inicia falando de sua juventude, com seus amigos Alex e Colin. Um grupo mediano, “comum”. Na escola conheceu Adrian Finn, um sujeito de classe social bem mais elevada, além de mais inteligente que seus colegas; alguém que já havia lido Camus e discutia abertamente nas aulas de literatura com uma superioridade que impressionava a todos. Nesta época, todos se chocam com o suicídio de Robson, que havia engravidado a namorada – “ Sorry, mum”. Mas eles crescem, cada um vai para seu

Ludwig Tieck

  O autor do conto da semana, Ludwig Tieck (1773-1853), é um dos expoentes do Romantismo alemão. Foi tradutor de Dom Quixote para o alemão. A edição brasileira, Feitiço de Amor e outros contos, da Editora Hedra, nova parceira da Biblioteca , foi traduzida por Maria Aparecida Barbosa (que assina também a introdução) e Karin Volobuef. O conto da semana, O Loiro Eckbert, inicia-se como um conto de fadas (afinal, o Romantismo alemão bebe na fonte destes contos e dos relatos populares, e os revitaliza): uma floresta; pais que rejeitam a filha, Bertha; uma velha e misteriosa mulher que mora isolada de todos dentro da floresta - apenas com um cachorro e um pássaro - e que a acolhe; um mistério que deve ser mantido em segredo –a ave que bota pedras preciosas. É a única proibição imposta pela velha – e com ela, a irresistível vontade de infringi-la. No entanto, ao completar 14 anos, foge do novo lar, com a tal ave: Completei quatorze anos, e é uma desventura para o ser humano o fato de

O Colecionador, de Massimo Bontempelli

O conto da semana é do italiano Massimo Bontempelli (1879-1960) e está no volume 9 do Mar de Histórias (Aurélio e Rónai).  Temos a história do barão Raimundo della Valle, que sempre organizou grandes coleções ao longo de sua vida. Mas não se trata apenas de um impulso colecionador patológico; o conto mostra o destaque que os livros tinham na vida do barão – a coleção começou e acabou em razão de algumas leituras. Pode ser que ao Barão tenha feito falta o zelo do barbeiro e do cura de eliminar da biblioteca de Dom Quixote uma infinidade de livros, tentando evitar aquilo que parecia ter-lhe causado a loucura. Certo dia lhe ocorreu abrir um volume da coleção de encadernações, a fim de examinar o estado da costura interna. Até então nunca lhe ocorrera abrir esse livro. Era uma edição do século XVI, de Comino, com encadernação autêncita de Viviano di Varese, em couro preto, com gravações a fogo; continha a vida de um capitão do século antecedente. Os olhos de Raimundo caíram, n

Tomas Tranströmer em português

Do ótimo blog  Poesia Ilimitada , quatro poemas do Nobel 2011.

Um Filme Falado, de Manoel de Oliveira

Mais uma estreia da Biblioteca: nunca tinha visto nada do cineasta português. Rosa Maria (Leonor Silveira) e sua filha Maria Joana (Filipa de Almeida) embarcam num cruzeiro de Lisboa a Bombaim, onde irão encontrar o marido/pai, piloto de avião. Rosa é professora de História, e o filme se inicia como uma “aula”, com bela fotografia, e uma série de perguntas da filha, pacientemente respondidas pela mãe. Lisboa, Marselha, Pompeia, Atenas, Istambul e Cairo, um desfile dos grandes centros da civilização ocidental. E também as grandes histórias – as sereias, Ulisses, Vasco da Gama, Dom Sebastião, Napoleão. O comandante do navio, um americano de origem polonesa (John Malkovich) se reúne com uma famosa cantora grega (Irene Papas), uma empresária francesa (Catherine Deneuve) e uma atriz italiana (Stefania Sandrelli); a presença de mãe e filha em total harmonia no restaurante chama a atenção do grupo e o comandante as convida para se juntar a eles. E é curioso: cada um fala a sua própria lí

As Naus, de António Lobo Antunes

As Naus António Lobo Antunes Alfaguara/Objetiva, 2011 182 páginas Apesar de lançado no Brasil este ano, o livro foi escrito em 1988, quando a hoje questionada União Europeia estava em seus melhores momentos – já havia incluído Portugal, Espanha e Grécia; tudo parecia caminhar incrivelmente bem. Curiosamente, Lobo Antunes oferece uma visão demasiadamente pessimista de seu país – ainda que a história se passe na década de 70, em meio ao processo de descolonização da África. O pessimismo é, no entanto, bastante atual. Nunca havia lido nada de Lobo Antunes, que no Brasil é o outro time do Fla-Flu que se formou entre os seus admiradores e os de Saramago. Essa disputa, inclusive, nos fez ignorar outros nomes da literatura portuguesa, que só agora começamos a notar. Em As Naus , há uma infinidade de narradores; da terceira para a primeira pessoa, num mesmo capítulo; o mesmo acontece com a questão temporal – saímos do século XV para o XX em duas ou três frases:

Cópia Fiel, de Abbas Kiarostami

Um escritor inglês, James Miller (William Shimell, na verdade um conhecido cantor de ópera que estreia como ator) e uma dona de galeria de arte francesa, Elle (Juliette Binoche, no papel que lhe deu o Palma de Ouro de Melhor Atriz em 2010), que vive há tempos na Toscana, se encontram no lançamento do livro Cópia Fiel. O encontro dá origem a um passeio, sem grandes compromissos (afinal, ele tem um trem para pegar ainda naquele dia). Numa parada, enquanto James atende a um telefonema, a dona do café pensa que os dois formam um casal – e Elle não se preocupa em desfazer a confusão. A partir daí, os dois passam a atuar como se de fato estivessem casados há anos, e por várias vezes ficamos em dúvida se eles não se conhecem realmente há mais tempo. Mas confesso que o filme me pareceu um pouco arrastado, especialmente a partir da metade, quando os dois passam a representar o casal que não formam (a cópia fiel?), em que pese Binoche e a fotografia...