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Mostrando postagens de maio, 2012

Boas Influências

Via Editora Dublinense

Conto da semana, de David Dephy

Esta semana postei uma entrevista dada pelo Ian McEwan. A interpretação que ele deu ao próprio romance foi considerada horrível pelo professor do filho. Muitos dizem que o autor é um péssimo intérprete da própria obra. O que dizer, então, dos personagens? Talvez o mais capacitado para falar da obra seja o personagem, e não o autor. Em seus contos reunidos em Words Words Words, o romancista, contista e poeta georgiano David Dephy conversa com personagens de Poe, Hemingway, Kipling, Dickens e Eurípedes. O narrador - Dephy? - descobre então as verdadeiras versões; não aquelas dos autores, mas da boca de Medeia, por exemplo:  - Mas na mitologia... - Na mitologia eu sou aquela da realidade - fiel ao meu marido, honesta. E no seu livro eu sou imoral, vingativa, indigna, rasa (...)  Por mais de dois mil anos eu tenho sido condenada a sofrer porque o autor acho que esse seria o modo mais interessante para o leitor (...) Os Deuses não me sacrificaram nem me apagaram dos mito

No One is Here, Except All of Us, de Ramona Ausubel

No One is Here Except All of Us Ramona Ausubel Riverhead Books A dica desse livro saiu no blog da Absynthe; li na versão Kindle.  A autora, americana do Novo México, se inspirou nos relatos de sua avó romena. Nos Cárpatos, ao norte da Romênia, nove famílias vivem em Zalischik. Quem nos narra a história é Lena, de 11 anos, filha mais nova de um casal que planta repolhos. Eles vivem isolados do resto do mundo. Em 1939, com o início da guerra, os adultos ficam apreensivos. Na noite de 3 de setembro, encontram uma mulher às margens do rio - essa mulher será sempre chamada de "estranha" - que relata os horrores que presenciou -  seu vilarejo arrasado do mapa; seus pais, irmã, marido e filhos assassinados, com requintes de crueldade. O pânico aumenta, e surge então a ideia que irá agradar a todos: refundar o mundo. Como se fizéssemos um "control-alt-del", e tudo começasse novamente. Isso ocorre nas primeiras páginas, enquanto os habitante

Brás Cubas, por Woody Allen

Perguntado sobre os cinco livros mais importantes que já leu, Woody Allen fala de Machado de Assis,  aqui. Alguém do Brasil me mandou o livro Epitaph of a Small Winner (título em inglês das Memórias Póstumas de Brás Cubas). Era um livro fino e resolvi ler. Se fosse grosso, eu o teria desprezado. Fiquei chocado com um livro tão interessante e divertido (...) ele poderia ter sido escrito ontem, de tão moderno e divertido. Uma obra extremamente original (...) sem sentimentalismo. No The Guardian.

Conto da semana, de David Rose

O conto do inglês David Rose, Flora, abre a antologia Best British Short Stories 2011.  O narrador encontra a garota no Kew Gardens - e vai convidá-la para frequentar sua impressionante biblioteca de botânica. Ao vê-la com uma cópia de  Flora Pyrenaica, de Wilson, não se contém - tenho uma edição superior a essa. Após uma breve conversa, ele lhe franqueia acesso à sua biblioteca de botânica. A partir daí, Rose nos conta a rotina nos dias seguintes, na sua sala de estar-biblioteca, com a presença da estudante, que se põe a copiar os desenhos das plantas. O narrador serve-lhe biscoitos, tudo para tornar sua presença a mais agradável possível. A obsessão do narrador não se resume à sua coleção de plantas - alcança os livros de botânica e, claro, a estudante. Ela se encanta com o material posto à sua disposição - faz uma aquarela de uma flor - Convolvulus mauritanicus  e a dá de presente ao botânico. O romance por todos esperado não se concretiza - nem de longe. Ao mesmo temp

O Escritor, o Filho e o Professor

Na entrevista que deu ao The Guardian, Ian McEwan fala sobre seu modo de escrever, o que pensa de Tony Blair (que o confundiu com um pintor)... Neste trecho, ele fala da estranha sensação que foi ajudar seu filho a escrever um ensaio escolar sobre um de seus livros e descobrir que o professor detestou sua interpretação -   a very low grade...

Catástrofe, de Lee Rourke

O conto da semana é do inglês Lee Rourke. Ele ganhou o curioso prêmio Not the Booker Prize , do The Guardian. Catástrofe é o relato em primeira pessoa de um homem desesperado que invade um apartamento no 12º andar de um prédio que está para ser demolido. Com a crise econômica e financeira internacional, ele perdeu tudo o que tinha - o pouco  que restou jogou pela janela, com exceção de uma cadeira e uma TV. E pela TV ele assiste à cobertura do evento que está protagonizando - as breaking news do noticiário falando de um homem que está no apartamento prestes a ser explodido... a água e a eletricidade já foram cortados pela polícia.  O relato deste desesperado é o leitor - o autor do crime. Esperando pela catástrofe. Vou cair com o prédio, seu crime não irá me derrotar. Ao mesmo tempo, critica o que vem ouvindo e assistindo pela TV: que teve problemas na infância, que não foi amado pela mãe, que possui reféns etc. - todos esses clichês que já ouvimos antes. O que dir

O Céu dos Suicidas, de Ricardo Lísias

O Céu dos Suicidas Ricardo Lísias Alfaguara, 2012 186 p. Nunca havia lido nada de Ricardo Lísias. Este O Céu dos Suicidas foi lançado em abril. Um colecionador sem coleção,  chamado Ricardo Lísias, professor universitário e em crise pelo suicídio de André, seu grande amigo.  O fato de o personagem ser um colecionador - ou ex-colecionador - me lembra uma outra leitura recente - a do Museu da Inocência, de Pamuk. Lá, o narrador - Ohran - organiza um museu que retrata a Istambul dos anos 70, gravitando em torno de sua amada e proibida Fusun; aqui, um colecionador - Ricardo - também às voltas com conflitos dentro da família, culpas e  perdas irreparáveis (no caso, o amigo que procurou a sua ajuda e em seguida enforcou-se) dá cursos sobre o assunto - seu conhecimento é o que lhe sobrou, já que não guarda mais nenhuma de suas antigas coleções. Tanto Lisias quanto Pamuk têm que esclarecer: não sou o Ricardo! Não sou o Orhan! Estamos na ficção, por mais que haja um forte

Conto da semana, de Etgar Keret

O israelense Etgar Keret (Tel Aviv, 1967) terá sua estreia no Brasil - A Casa da Palavra irá editar "O Motorista de Ônibus que queria ser Deus". Sua obra já é conhecida em mais de 30 países como um dos mais criativos escritores israelenses de sua geração. O conto da semana foi extraído do sensacional  Words Without Borders . Ludwig e eu matamos Hitler - ou Uma Primavera em Berlim. O narrador e o tal Ludwig perambulam por Berlim já com os russos batendo à porta. Passam por um cartaz de Hitler e Ludwig lembra que o conheceu na juventude - quando ele ainda não usava aquele bigode ridículo. Anna o trocou por Hitler, fato que ele até hoje não perdoa - não que você seja estúpido, mas você não tem imaginação. Já Hitler... ele é um artista! Próximo às ruínas da Opera, os dois encontram um bêbado que pensa estar havendo um concerto - ele ouve os canhões e diz que a Filarmônica está tocando 1812... E, mais à frente, com uma capa... Hitler em pessoa! Adolf, como est

O Museu de Pamuk ganha vida

Como já era esperado, o romancista Orhan Pamuk inaugurou, no último dia 27 em Istambul, um museu dedicado à memória dos personagens fictícios do seu romance Museu da Inocência. Lá estão os cigarros tocados por Fusun, o amor impossível de Kemal. Para o autor, "é talvez o primeiro museu baseado em um romance", e faz questão de frisar que não se trata de seu museu - como o livro não trata de sua história. O autor diz ter gasto praticamente o que ganhou com o Nobel de 2006 nesta ideia. São 83 vitrines, uma para cada capítulo do livro, que se passa na Istambul dos anos 70. 

A Chave de Casa, de Tatiana Salem Levy

A Chave da Casa Tatiana Salem Levy Record, 2007 Não faço outra coisa senão olhar, tocar, observar a chave. Conheço seus detalhes de cor, o tamanho preciso de suas curvas e de sua argola, seu peso, sua cor gasta. Uma chave desse tamanho não deve abrir porta alguma. A essa altura já deveriam por certo ter mudado, se não a porta, certamente a fechadura. Seria um disparate acreditar que tanto tempo depois a chave da casa permaneceria a mesma. Tenho certeza de que até meu avô é consciente disso, mas também imagino que deva ter uma curiosidade enorme de saber se ainda está lá o que deixou para trás. Que coisa estranha, que coisa esquisita deve ser: largar o país, a língua, abandonar a família em direção a algo completamente novo e, sobretudo, incerto . Com atraso constrangedor, li neste feriado A Chave de Casa, de Tatiana Salem Levy (Record, 2007). É curioso que, quando se fala em literatura judaica, aqui, nos Estados Unidos e na Europa, em geral se fala da literatura as