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Editora: Companhia das Letras,
Tradução: Sergio Flaksman (do inglês)
568 páginas
2011
“Era o momento mais feliz da minha vida, mas eu não sabia. Se soubesse, se tivesse dado o devido valor a essa dádiva, tudo teria acontecido de outra maneira? Sim, se eu tivesse reconhecido aquele momento de felicidade perfeita, teria agarrado com força e nunca deixaria que me escapasse. Levou alguns segundos, talvez, para aquele estado luminoso tomar conta de mim, mergulhando-me na paz mais profunda, mas ele me pareceu ter durado horas, até mesmo anos. Naquele momento, na tarde de segunda-feira, 26 de maio de 1975, em torno de quinze para as três, assim como nos sentíamos além do pecado e da culpa, o mundo todo parecia ter sido liberado da gravidade e do tempo” (p. 15).
A história de Kemal, de família tradicional de Istambul e que aos 30 anos está prestes a se casar com Sibel, e Füsun, uma prima distante e pobre de 18 anos é também a história da Turquia na década de 1970.
A eterna divisão do país entre ocidente e oriente; os costumes cultivados pelas famílias tradicionais – o não casamento com Sibel não seria uma desgraça social se a causa não fosse a prima pobre... A família ocidentalizada não vê maiores problemas em seus encontros com Sibel em um apartamento da família nem o sexo antes do casamento.
Mas quando o noivado se desfaz e vem à tona a sua causa – sua relação com Füsun, a situação torna-se insustentável. Nesse momento, a virgindade se torna algo valioso – afinal, ele acabou de roubar de Sibel o que lhe era mais caro – e, como deixa claro, se ela não dá a mínima por isso, a sociedade turca se importa.
Por causa disso, cai em ostracismo, torna-se uma sombra do que um dia tinha sido. Por outro lado, não pode se casar com Füsun, que sempre quis ser atriz de cinema e em determinado momento se casa com outro. E é essa impossibilidade que o leva a criar um museu.
O Museu é composto por vários objetos colecionados desde essa época por Kemal, tudo para provar e documentar seu amor por Füsun (o que inclui as 4.213 guimbas de cigarros deixadas por ela). Curiosamente, o próprio Pamuk está realmente criando um museu que irá conter vários dos objetos mostrados por Kemal aos leitores da história.
Mas Kemal fala de um tipo de museu;
“Não estou falando do Louvre nem do Beaubourg, nem dos outros museus lotados e importantes da mesma estirpe; estou falando dos muitos museus vazios que encontrei em Paris, coleções que ninguém jamais visita. Havia o Musée Édith Piaf, fundado por um grande admirador, onde com hora marcada pude ver escovas, pentes e ursos de pelúcia; o Musée de la Préfecture de Police, onde passei um dia inteiro; e o Musée Jacquemart-André, onde objetos variados eram expostos junto a quadros de maneira muito original (...)” (p. 523-524).
É interessante que em outro livro de Pamuk, Istambul, o edifício onde sua família morava era um “museu escuro”, segundo suas próprias palavras.
Por fim, Kemal sobrevive a tudo, inclusive Füsun, e "abre" a narrativa para a conclusão de Orhan Pamuk.
Bom blog que eu siga. A linguagem Português bela.
ResponderExcluirOlga Fuchs (Caracas)
Não conheço o autor ainda, mas fiquei interessada... Por onde começo: "Istambul" ou "O Museu da Inocência" ?
ResponderExcluirOlá, Virgínia. Istambul é excelente, mas não é um romance, e sim um livro sobre a cidade em que nasceu. Um "guia autobiográfico". Pode ser uma bela introdução à obra de Pamuk, já que em O Museu da Inocência há várias referências à cidade. Além destes dois, li também Neve e Meu Nome é Vermelho (que em minha opinião é o melhor de todos - passado em Istambul do séc. XVI).
ResponderExcluirÓtimas dicas ! Vou escolher pelo menos um deles para ler nas férias... Por ora estou inclinada a ler "O Museu da Inocência", mas pesquisarei os outros dois. A ambientação de "Meu nome é Vermelho também parece bem promissora:)) Obrigada !
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