O conto da semana é de Italo Calvino, de quem já li O Visconde Partido ao Meio e O Cavaleiro Inexistente. Este A Ovelha Negra integra o livro Um General na Biblioteca (Companhia das Letras, 2001, tradução de Rosa Freire d’Aguiar). Uma teoria sobre distribuição de renda...
Uma curtíssima e curiosa história de um país em que todos eram ladrões – À noite, cada habitante saía, com a gazua e a lanterna, e ia arrombar a casa do vizinho. Voltava de madrugada, carregado, e encontrava a sua casa roubada. E assim todos viviam em paz e sem prejuízo, pois um roubava do outro, e este, um terceiro, e assim por diante, até que se chegava ao último, que roubava o primeiro.
E assim o país prosperava, e tudo seguia normalmente até que apareceu um sujeito honesto, e a crise se instaurou: foi preciso fazê-lo compreender que, se quisesse viver sem fazer nada, não era essa uma boa razão para não deixar os outros fazerem. Cada noite que ele passava em casa era uma família que não comia no dia seguinte.
Convencido, passou a sair de sua casa (deixando-se roubar), mas nem por isso passou a agir. E causou, então, um grave desequilíbrio na renda nacional, uma vez que os que não eram roubados acabaram ficando mais ricos que os outros, e passaram a não querer mais roubar. E além disso, os que vinham roubar a casa do homem honesto sempre a encontravam vazia; assim iam ficando mais pobres.
Os mais ricos passaram a pagar aos mais pobres para roubarem em seu lugar, e pegaram os ainda mais pobres que os pobres ainda para defender seu patrimônio contra os menos pobres. E assim criaram o salário, a polícia e as prisões.
Ao final, já não se falava mais em roubar ou não roubar, mas em ricos e pobres. O honesto, coitado, já tinha morrido de fome há muito tempo...
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