Daniel Kaminsky levaria vários anos para se habituar ao barulho esfuziante de uma cidade que se levantava sob a mais indisfarçada algaravia. Havia descoberto logo que ali tudo se tratava e se resolvia aos gritos, tudo rangia por causa da ferrugem e da umidade, os carros avançavam entre as explosões e o ronco dos motores ou os longos bramidos das buzinas, os cães latiam com ou sem motivo e os galos cantavam até a meia-noite, enquanto cada vendedor anunciava sua presença com um apito, um sino, uma corneta, um assovio, uma matraca, uma flauta de bambu, uma quadrinhabem rimada ou um simples berro. Ele tinha encalhado numa cidade na qual, ainda por cima, toda noite, às nove em ponto, retumbava um canhonaço sem que houvesse guerra declarada nem muralhas para fechar, e onde sempre, sempre, em épocas de bonança e em momentos de aperto, alguém escutava música, e cantava
O conto da semana é novamente de Calvino – Quem se contenta – e integra Um General na Biblioteca : Havia um país em que tudo era proibido. Ora, como a única coisa não-proibida era o jogo de bilharda, os súditos se reuniam em certos campos que ficavam atrás da aldeia e ali, jogando bilharda, passavam os dias. E como as proibições tinham vindo paulatinamente, sempre por motivos justificados, não havia ninguém que pudesse reclamar ou que não soubesse se adaptar. Passaram-se os anos. Um dia, os condestáveis viram que não havia mais razão para que tudo fosse proibido e enviaram mensageiros para avisar os súditos que podiam fazer o que quisessem. Os mensageiros foram àqueles lugares onde os súditos costumavam se reunir. - Saibam – anunciaram – que nada mais é proibido. Eles continuaram a jogar bilharda. - Entenderam? – os mensageiros insistiram – Vocês estão livres para fazerem o que quiserem. - Muito bem – responderam os súditos – Nós jogamos bilharda. Os mensagei
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