A ideia de ler toda a Comédia leva invariavelmente a descobrir romances, contos e novelas que costumam ser esquecidos do público - ao menos, o brasileiro - e é justamente o caso destas Memórias de duas jovens esposas. Romance epistolar, acompanha duas amigas dos 17 aos 30 anos, que saem do convento e tomam destinos bem diferentes - Luísa de Chaulieu passará sua vida à procura de amor; a outra, Renata de Maucombe, procura um marido. Como consta de uma das cartas, uma terá as flores sem os frutos, a outra, os frutos sem ter tido as flores.
Luísa vem de uma das grandes famílias da França, e vai encontrar o que quer duas vezes - dando-se mal em ambas; um professor de espanhol, o duque de Soria, e Maria-Gastão, um artista duro (eles estão sempre por aqui na obra de Balzac... no Chat-qui-pelote, temos Augustine e Theodore de Sommervieux). Tirana, arrasta os dois infelizes.
Renata é mais conformada; dedica-se à família e abandona Paris para a província. São os frutos em flor.
Escreve Renata de l'Estorade:
No dia seguinte ao casamento, o ato terrível, que faz da donzela uma mulher e do enamorado um marido, pode derrubar os andaimes de tuas sutis preocupações. Precisas saber, pois, finalmente, que dois namorados, da mesma forma que duas pessoas casadas, como eu e Luís, vão buscar, sob as alegrias de uma boda, segundo a expressão de Rabelais, "um grande talvez".
Bom, há que se esclarecer que Rabelais se refere à morte...
E é o que inevitavelmente ocorre. Luísa pensar ter uma rival e, quando descobre o que de fato se passa, é demasiado tarde!: empenhou-se em pegar uma tuberculose e acabou morrendo.
O romance é lento - André Gide o achava confuso e pastoso - mas é sempre um grande retrato da França pós-Napoleão. A aristocracia procurava restaurar seus privilégios, a burguesia procurava uma forma de conciliar os interesses de ambos. O direito civil aparece em toda a Comédia:
O Código Napoleão de 1804 instituiu a igualdade entre herdeiros do mesmo grau. Antes, apenas os filhos homens recebiam o patrimônio.
O pai de Luísa pede-lhe que abra mão de sua parte na herança em favor do irmão, para que este constituísse um morgado, condição para ascender à aristocracia. Para ele, o infame Código Civil do sr. de Bonaparte (...) fará com que metam no convento tantas moças nobres quantas ele fez casarem. E diz à filha:
Sabes, minha filha, quais são os efeitos mais destruidores da Revolução? Jamais os suspeitarias. Ao cortar a cabeça de Luís XVI, a Revolução cortou a cabeça de todos os chefes de família, há somente indivíduos. Ao querer tornar-se uma nação, os franceses renunciaram a ser império. Ao proclamar a igualdade de direitos à sucessão paterna, mataram o espírito de família, criaram o fisco. Prepararam, pois, a fraqueza das superioridades e a força cega da massa, a extinção das artes, o reinado do interesse pessoal e abriram caminho à conquista. Achamo-nos entre dois caminhos: ou constituir o Estado pela família, ou constituí-lo pelo interesse pessoal.
Preste atenção em José Bridau: aqui, o pintor - que é sempre associado a Eugéne Delacroix, muito admirado por Balzac - testemunha o casamento secreto de Maria Gastão e Luísa, em 1833. Mas ele está em outras partes da Comédia.
Luísa vem de uma das grandes famílias da França, e vai encontrar o que quer duas vezes - dando-se mal em ambas; um professor de espanhol, o duque de Soria, e Maria-Gastão, um artista duro (eles estão sempre por aqui na obra de Balzac... no Chat-qui-pelote, temos Augustine e Theodore de Sommervieux). Tirana, arrasta os dois infelizes.
Renata é mais conformada; dedica-se à família e abandona Paris para a província. São os frutos em flor.
Escreve Renata de l'Estorade:
No dia seguinte ao casamento, o ato terrível, que faz da donzela uma mulher e do enamorado um marido, pode derrubar os andaimes de tuas sutis preocupações. Precisas saber, pois, finalmente, que dois namorados, da mesma forma que duas pessoas casadas, como eu e Luís, vão buscar, sob as alegrias de uma boda, segundo a expressão de Rabelais, "um grande talvez".
Bom, há que se esclarecer que Rabelais se refere à morte...
E é o que inevitavelmente ocorre. Luísa pensar ter uma rival e, quando descobre o que de fato se passa, é demasiado tarde!: empenhou-se em pegar uma tuberculose e acabou morrendo.
O romance é lento - André Gide o achava confuso e pastoso - mas é sempre um grande retrato da França pós-Napoleão. A aristocracia procurava restaurar seus privilégios, a burguesia procurava uma forma de conciliar os interesses de ambos. O direito civil aparece em toda a Comédia:
O Código Napoleão de 1804 instituiu a igualdade entre herdeiros do mesmo grau. Antes, apenas os filhos homens recebiam o patrimônio.
O pai de Luísa pede-lhe que abra mão de sua parte na herança em favor do irmão, para que este constituísse um morgado, condição para ascender à aristocracia. Para ele, o infame Código Civil do sr. de Bonaparte (...) fará com que metam no convento tantas moças nobres quantas ele fez casarem. E diz à filha:
Sabes, minha filha, quais são os efeitos mais destruidores da Revolução? Jamais os suspeitarias. Ao cortar a cabeça de Luís XVI, a Revolução cortou a cabeça de todos os chefes de família, há somente indivíduos. Ao querer tornar-se uma nação, os franceses renunciaram a ser império. Ao proclamar a igualdade de direitos à sucessão paterna, mataram o espírito de família, criaram o fisco. Prepararam, pois, a fraqueza das superioridades e a força cega da massa, a extinção das artes, o reinado do interesse pessoal e abriram caminho à conquista. Achamo-nos entre dois caminhos: ou constituir o Estado pela família, ou constituí-lo pelo interesse pessoal.
Preste atenção em José Bridau: aqui, o pintor - que é sempre associado a Eugéne Delacroix, muito admirado por Balzac - testemunha o casamento secreto de Maria Gastão e Luísa, em 1833. Mas ele está em outras partes da Comédia.
...E Balzac já tinha identificado o lava-jato. E.
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