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Machines like me, de Ian McEwan

Ian McEwan
Machines Like Me
Jonathan Cape
320 p.


Orwell escreveu em 1984 o que se convencionou chamar de futuro distópico. O cinema, nos últimos anos, vem abusando, com mais ou menos qualidade, desse, digamos, gênero. Mas apesar de McEwan falar de inteligência artificial e robôs antropomórficos, este Máquinas como eu (li a edição inglesa no Kindle antes da chegada da edição brasileira e atrasei o post) trata, na verdade, de um "passado distópico". Em certa medida, estaria mais para um Complô contra a América, quando Roth imagina o que poderia ter acontecido num eventual governo americano fascista nos anos 30/40.

Estamos em 1982 numa Londres diferente: os argentinos efetivamente deram uma surra humilhante ao tomarem as Malvinas, levando à queda de Thatcher. Alan Turing não morreu (bom, na verdade, nem John Lennon...), e por aí vai. Nesse estranho mundo, uma geração de robôs chega ao mercado - Adão, na versão masculina, e Eva. O narrador, Charlie Friend, que aos 32 anos vive na internet, acaba adquirindo um. Mas, ao invés de comprar uma Eva, leva o Adão. Surge um curioso triângulo entre os três... 

Miranda esconde um segredo e, curiosamente, Adam adverte seu proprietário de que há algo de errado com ela. As máquinas são contaminadas pelo sistema moral dos seus criadores mas, ao contrário do mundo de Isaac Asimov e suas três leis fundamentais da robótica, Adam acabará colocando em risco a vida dos dois humanos da relação. 

Como em outros livros de McEwan, há um ponto de inflexão na história, e contá-lo é algo que, evidentemente, não faz sentido. No final, a confirmação de que um ano de lançamento de Ian McEwan é sempre um grande ano para o leitor.

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